Cisnes negros e surpresas estratégicas: o imprevisível na vida da empresa

Nassim Nicholas Taleb é um ensaísta, estatístico e analista de riscos norte-americano de origem libanesa, que foi alçado à condição de celebridade como um quase-profeta, quando teve início a crise dos subprimes, em 2008. A crise, que surgiu de repente e pegou de surpresa as maiores cabeças do establishment econômico, imediatamente fez com que todas as atenções se voltassem para o livro que Taleb havia escrito no ano anterior, chamado “A lógica do cisne negro”.  

Que lógica é essa? O título do livro é uma metáfora: um “cisne negro” é um acontecimentos absolutamente imprevisível, que ninguém é capaz de prever até que aconteça, deixando todo mundo sem reação — exatamente como foi a crise de 2008. O uso do cisne negro como referência refere-se ao fato de que, até que os cisnes negros aparecessem no mundo, flagrados na Austrália por um navegador holandês em 1697, o mundo europeu não tinha ideia de que eles pudessem existir: todos os cisnes conhecidos até então eram brancos. 

A ideia que Taleb nos traz em seu livro é a de que, por mais que planejemos e façamos previsões sobre como será o futuro, é impossível prever todos os acontecimentos: o novo virá, inevitavelmente, sem que estejamos preparados para enfrentá-lo. Seria então, inútil o planejamento? — perguntariam alguns? A melhor estratégia seria, então, não ter estratégia alguma, já que sempre haverá imprevistos? 

Decididamente, a resposta é não, muito pelo contrário: planejando, conseguimos prever a maior parte das mudanças que nos interessam e nos qualificando para enfrentá-las. Mas, precisamos também nos preparar para o imprevisível: precisamos ser capazes de nos manter num estado de prontidão, para enfrentarmos também aquilo contra o que não pudemos nos planejar!

Estar pronto a lidar com a surpresa, entretanto, não é fácil — é preciso ter uma atitude determinada e assertiva em relação ao meio ambiente da empresa. 

A propósito, muito antes de Taleb, um dos grandes teóricos da gestão estratégica, H. Igor Ansoff (1918-2002), cunhou a expressão “surpresa estratégica” para referir-se aos “cisnes negros” na vida de uma empresa. “Como acontece num sistema de observação através de radar”, comenta Ansoff, “a despeito dos melhores esforços desenvolvidos, alguns fenômenos sempre escaparão aos observadores do ambiente, tornando-se surpresas estratégicas“. 

Para Ansoff, quatro características descrevem uma surpresa estratégica: 

  • O fenômeno chega inesperadamente, sem que se pudesse prevê-lo.
  • Ele coloca novos problemas, nos quais a empresa tem pouca experiência anterior. 
  • Se a empresa não responder adequadamente, incorrerá em grandes perdas financeiras ou na perda de alguma grande oportunidade.
  • Embora urgente, a resposta não pode ser dada prontamente pelas políticas e procedimentos usuais da empresa, mas requer a criação de um novo SARE — Sistema de Análise e Resposta Estratégica, que irá investigar o contexto em que a empresa opera.   

As características desse novo SARE são:

  • Uma rede especial para comunicações de emergência deve ser montada. Essa rede deve passar a operar, propositalmente ignorando os limites da estrutura organizacional normal, filtrando informações e rapidamente as passando para toda a organização. 
  • Durante o tempo de vigência dessa emergência, as responsabilidades da alta administração devem ser reposicionadas:
  • um grupo dá atenção ao controle e à manutenção do bom clima dentro da organização;  
  • outro grupo assegura a continuidade dos negócios, com o mínimo possível de rupturas; e 
  • um terceiro grupo se encarrega de preparar e aplicar a resposta da empresa à surpresa.

As mudanças em tecnologia nos oferecem inúmeros exemplos de “cisnes negros” ou “surpresas estratégicas” que as organizações e profissões tradicionais são obrigadas a encarar de frente: o Uber “foi um cisne negro” para os taxistas; o Airbnb, um “cisne negro” para a hotelaria; a Netflix, um “cisne negro” para os canais de TV abertos e a cabo e para o cinema; o e-book, um “cisne negro” para as editoras de livros impressos; as fintechs, um “cisne negro” para os bancos tradicionais. 

No futuro próximo, outros “cisnes negros” já estão à vista: o carro autônomo, assombrando os motoristas de ônibus, caminhões e táxis; os chatbots, assombrando os cuidadores, secretárias, babás e assistentes; os algoritmos de investimentos assombrando os assessores financeiros. 

Pergunta-se: 

1. Você se sente em estado de prontidão para enfrentar “surpresas estratégicas”?  

2. Existe alguma chance perceptível de um “cisne negro” estar à espreita na próxima curva, vindo estragar o seu negócio?

3. Se sua resposta à pergunta anterior foi não, imagine, então, um “cisne negro” para afrontar seu negócio. O que seria ele?  

Fontes bibliográficas: 

Fernando Dantas, em “Taleb quer sistema que ‘goste da desordem’ ”, matéria publicada no jornal “O Estado de São Paulo”, caderno “Economia”, edição de domingo, 8 de abril de 2012, p. B10. Administração de surpresas estratégicas: 

H. Igor Ansoff, em “Estratégia Empresarial”, São Paulo, Ed. McGraw-Hill do Brasil, 1977. 

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